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segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

SOBRE "CAUSOS" E CASAS, AS MENTIRAS DA POLÍTICA.



Por Fernando Moreno Machado

“Exigimos que sejam, legalmente perseguidos aqueles que propagam e disseminam mentiras políticas através da imprensa.” Esta declaração indignada foi extraída de um manifesto do partido nazi de 1920. As mentiras dos políticos são, nas sociedades fundadas no princípio da soberania popular, consideradas algo de extrema gravidade mas, nem sempre as cruzadas em favor da verdade na política são inspiradas pelas melhores intenções.

Iniciamos o ano vendo um político processar um internauta por expressar sua opinião que, até onde sabemos, é livre no Brasil garantida por nossa constituição. Apesar do PT e de seus aloprados. Entretanto, como de costume, aqueles que se dizem inventores do universo não gostam do contraditório. O fato do internauta em questão ser filho de uma Presidente de Sindicato que não dança conforme a música da situação e, com isso “incomodar” os feitos de sua administração, e ainda por cima, o fato dela ser filiada ao maior partido de oposição ao dele, claro, nada tem a ver com o motriz de sua ação, dirá o nobre político.

Outros, incluindo o que ousa aqui expressar a sua opinião, já publicaram coisas ainda mais pesadas contra o mesmo político e/ou seu partido. Questiono: Não somos merecedores da atenção do nobre político que não nos brindou com uma ação? Ou por não sermos filhos de uma adversária política, nossas indagações não são uma ofensa ao intocável? Nenhuma conotação aqui ao ótimo filme dirigido por Brian de Palma em 1987, “Os Intocáveis” onde na Chicago dos anos 30, Al Capone corrompe, controla e corroí a cidade da forma que ele deseja através de suas atividades rentáveis, porém ilegais e criminosas.

A experiência pessoal ensina-nos que não é possível dizer sempre a verdade, nem na vida privada, nem na vida pública, pela simples razão de que há sempre aspectos da verdade que não favorecem as nossas opiniões ou projetos. Logo, a verdade é um paradoxo da democracia: uma exigência simultaneamente indispensável e razoável que, por isso mesmo, podemos qualificar de utópica.

Como é que os políticos lidam com esta dificuldade central, tendo em conta a gravidade que a opinião pública atribui à deliberada deturpação dos fatos? No essencial, criando corpos especiais de assessores encarregados de produzirem a informação factual de que os governantes depois se servem para falar ao povo. Se os fatos vierem a revelar-se falsos, a responsabilidade poderá sempre ser transferida para o staff, visto que o político se limitou a transmitir de boa fé aquilo que outros o haviam persuadido ser a verdade.

O político pode ser encontrado em falta, mas dificilmente se provará que mentiu. A mentira factual é hoje muitíssimo perigosa, visto que a opinião pública dispõe de poderosíssimos meios de escrutínio que se estendem, inclusive, às vidas pessoais dos detentores de cargos públicos. Todavia, a política não lida apenas com fatos, mas também com interpretações e, sobretudo, com projetos, domínios em que se torna muito mais difícil estabelecer uma distinção tão clara entre o verdadeiro e o falso. Nesta perspectiva mais vasta, a questão central consiste em saber como distinguir a demagogia da verdade, visto que a demagogia é uma patologia inseparável da democracia, ou seja, do sistema que concede aos cidadãos a possibilidade de influenciarem ou determinarem decisões políticas através do voto.

Pode a demagogia ser combatida exclusivamente com a verdade, ou será necessária alguma mentira à mistura para derrotá-la? Deve o político de “reta intenção” prescindir por inteiro da mentira se constatar que, ao menos em certas circunstâncias, ela possui uma vantagem natural sobre a verdade? James Callaghan, primeiro-ministro britânico nos anos 70, dizia que a mentira dá à volta ao mundo enquanto a verdade ainda está a calçar as botas.

Este melancólico pensamento reconhece o quanto às vezes, é sedutora a mentira. Não só porque a favorece a estupidez humana, mas também por ter do seu lado a fantasia e o prazer de se ser enganado. Que concluir, então, sobre a difícil relação entre a verdade e a política? Que é exagerado o receio de que a mentira possa só por si destruir a política democrática, e que devemos desconfiar daqueles que nos prometem uma política em absoluto livre de mentira.

Todavia, embora um certo nível de mentira seja razoavelmente bem tolerado pelas sociedades livres, não se pode negar que, passado um certo ponto, a desconfiança de todos em relação a todos pode minar os seus fundamentos. O importante não é abolir de uma vez por todas a mentira da política, mas fortalecer o sentido crítico dos cidadãos e garantir que ele possa exprimir-se em condições de liberdade. Para usar a feliz expressão do recentemente falecido filósofo Richard Rorty: “Cuidemos da liberdade, que a verdade cuidará de si mesma”.

Fernando Moreno Machado estudou Sociologia e Política pela FESPSP (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo), é Secretário-Geral do PSDB de Porto Feliz-SP, Delegado Estadual e Nacional do PSDB.

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